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22 de agosto de 2014

Sobre mudança de perspectiva e gostar de adquirir livros | Vida de Leitora #07



Há alguns meses escrevi um post falando sobre ter mais livros do que podia ler e do quanto aquilo estava me incomodando. Pelos comentários recebidos, pude perceber que não sou a única a passar pela situação e que, aparentemente, o acúmulo de livros é um fato recorrente na vida dos apaixonados por livros.

Também me dei conta de que alguns dos livros na minha pilha de não lidos já não me despertam o mesmo interesse de quando os adquiri. Não são muitos e, em sua maioria, são livros que comprei por impulso, sem parar para pensar se realmente iria apreciar a leitura. Obviamente, me senti mal por isso, afinal de contas, investi dinheiro naqueles livros, certo? E agora, não tenho a mínima vontade de lê-los. Por outro lado, muitos dos livros esquecidos continuam a me atrair e me pergunto constantemente o motivo de não os ter lido ainda.

Meio desesperada e sufocada pelos livros não lidos da estante, em março resolvi me impor um book buying ban - uma proibição de comprar livros (ou um certo número de livros) - até o mês de agosto, quando deveria repensar a ideia e ver se tinha funcionado. Até junho as coisas funcionaram muito bem, mas é claro que depois disso tudo ficou um tanto "complicado", principalmente com o número absurdo de promoções que começaram a rolar desde julho. Logo, percebi que essa história de proibição não funciona para mim. Ainda assim, não foi uma experiência inútil; pude aprender bastante e modificar alguns dos meus hábitos como compradora de livros

Com o book buying ban - que não foi total, pois me permitia a compra de apenas um livro por mês - aprendi a ser um pouco mais criteriosa com o que iria adquirir, priorizando os clássicos ou livros de autores que já conhecia e sabia que não iria me decepcionar com a leitura. Passei a comprar livros que sabia que iria ler em algum momento da minha vida e que, mesmo que não gostasse de algum aspecto neles, a experiência continuaria a ser válida e enriquecedora. Dessa forma, priorizando a qualidade ao invés da quantidade, ficou claro que mesmo que um livro fique um ano parado na estante, ele ainda vai continuar me despertando o interesse.

Acredito muito que há um momento certo para cada leitura e que se um livro for lido na hora errada, a experiência pode ser arruinada. Logo, não vejo mal em comprar um livro que me interessa e que esteja com um preço bom mesmo que não vá lê-lo imediatamente. Gosto de saber que, na hora certa, ele já estará me esperando. A Tary, do canal LiteraTour, fez um vídeo muito interessante sobre o assunto e em determinado momento diz algo que acho muito bonito: os livros não lidos na estante são promessas. Ou seja, ao adquirir um novo exemplar sem a pretensão de iniciar a leitura imediatamente, estamos fazendo uma promessa de que algum dia o faremos.

Com essa mudança de perspectiva, parei de me desesperar com a pilha de não lidos, pois sei que vamos nos encontrar em algum momento. E quanto aos livros comprados por impulso, ainda não sei o que fazer. Provavelmente, trocarei em algum sebo ou doarei para alguma biblioteca. Assim, deixo espaço para as novas e desejadas aquisições.

Não sei se as minhas reflexões fizeram algum sentido para vocês, mas espero que seja de utilidade para aqueles que, de vez em quando, se assustam com a quantidade de livros parados na estante. Espero que ajude também aqueles que estão com medo de como irão reagir na Bienal. Penso que, desde que você não esteja se prejudicando financeiramente, não há problema em querer colecionar seus livros. Então, que tal encarar a situação dos livros não lidos na estante por uma perspectiva diferente e, quem sabe, até mais consciente e responsável? 

Texto publicado originalmente na coluna Literalmente Falando, do blog Literature-se.

13 de agosto de 2014

A Ilha do Dr. Moreau (H.G. Wells)



Publicado em 1896, A ilha do dr. Moreau, de H.G. Wells, é considerado até os dias atuais um dos maiores clássicos da literatura de ficção científica. A obra faz parte da vasta produção realizada nas últimas décadas do século XIX, quando houve um auge na produção de histórias de aventura que misturavam elementos fantásticos e/ou científicos, normalmente ambientadas em lugares distante e exóticos. Foi neste período que autores como Jules Verne, Robert Louis Stevenson, Joseph Conrad e Henry Rider Haggard se estabeleceram como grandes nomes da literatura.

Narrado em primeira pessoa, o livro traz a história de Edward Prendick que, em 1887, sobreviveu ao naufrágio da embarcação Lady Vain e, após alguns dias à deriva, foi resgatado por um navio que transportava animais. Lá, ele conhece um homem chamado Montgomery e seu criado, M'ling, um sujeito bastante estranho e grotesco. Após um tempo, o navio faz uma parada em uma pequena ilha vulcânica, onde desembarcam Montgomery, M'ling e os animais e o capitão resolve abandonar Edward.

Sabendo que não é bem-vindo à ilha, o ex-náufrago logo descobre que raramente navios passam pela região e que, por isso, deverá ficar por lá durante um bom tempo. Logo após o desembarque, Edward é apresentado ao seu anfitrião, o Dr. Moreau, e se recorda de um escândalo envolvendo este doutor - que costumava ser um cirurgião renomado em Londres - e experimentos de vivissecção. Sem ter para onde ir, Edward tenta se adaptar ao cotidiano da ilha e de seu anfitrião, mas gritos e barulhos estranhos vindos do laboratório do doutor e a sensação de ser seguido pela selva lhe indicam que há algo de muito anormal com aquela ilha e com os seus nativos. 

Apesar de conhecer o nome H.G. Wells, confesso que nunca tinha escutado falar de A ilha do dr. Moreau até ter conhecimento da série YA que tem início com The Madman's Daughter (aqui chama A filha do louco), de Megan Shepherd. Como tinha interesse na série, resolvi ler o clássico antes e gostei bastante da experiência.

A forma como Wells apresenta os acontecimentos através dos olhos de Edward contribui muito para a criação de uma atmosfera de suspense e mistério. Aliás, o cenário de uma ilha vulcânica, exótica e fora de rota é bastante intrigante e permite uma série de possibilidades. Admito que, conforme fui descobrindo os segredos que a ilha escondia, não me surpreendi muito. Por se tratar de um clássico, acredito que H.G. Wells influenciou e inspirou muitas histórias, de forma que o tema de A ilha do dr. Moreau (cientista meio "louco" que realiza experimentos nada convencionais) já foi retratado em outras obras da literatura, do cinema e até da televisão.

Ainda assim, foi inevitável não pensar em como o livro deve ter causado um certo impacto na época de sua publicação, quando havia uma discussão acerca de experiências que envolviam a vivissecção de animais. Além dessa discussão, o livro ainda abre margem para discutir sobre outras questões como a interferência do homem na natureza, a ética científica (até que ponto a ciência é capaz de ir para provar alguma teoria?), a religião (tanto cientistas brincando de Deus, quanto a importância da religião para uma sociedade),a responsabilidade moral, a identidade humana (o que é um ser humano? Quais são as características que definem um ser humano?) e a evolução.

Também gostei de poder conhecer uma obra clássica da ficção científica, gênero com o qual tive pouco contato na literatura. Ainda assim, de acordo com parâmetros mais atuais, é meio complicado definir até que ponto a obra é ficção científica e até que ponto é fantasia, já que para alguns aspectos da história não temos explicações científicas. No final, fiquei com a sensação de que a obra é uma mistura dos dois gêneros, o que funcionou muito bem. 

Para finalizar, recomendo bastante a leitura de A ilha do dr. Moreau para aqueles que gostam de conhecer os clássicos, que se interessam por ficção científica ou por H.G. Wells. Eu, que até então, nunca havia lido nada do autor, certamente irei ler suas outras obras.