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19 de março de 2020

RELEITURA: O Mistério do Trem Azul (Agatha Christie) | Hercule Poirot #06

Essa foi mais uma releitura de Agatha Christie! O primeiro contato que tive com a história foi em 2013 e, na época, lembro de não ter gostado muito e de ter achado o caso pouco engenhoso. Dessa vez, apesar de ainda achar que o livro não é um dos melhores da autora, gostei bem mais da experiência. Aqui nós encontramos uma história que mistura elementos de diferentes tipos de histórias de Agatha Christie: personagens disfarçados, encontros suspeitos em lugares afastados no meio da noite, roubo de joias e um mistério whodunit (Quem matou?).



Publicado em 1928, O Mistério do Trem Azul é uma das primeiras obras obras lançadas pela autora após o seu misterioso desaparecimento em um dos momentos mais conturbados de sua vida. Ainda que, de forma geral, o livro tenha obtido uma recepção positiva, a própria Agatha Christie não gostava dele. Ela chegou, inclusive, a admitir em sua autobiografia que o processo de escrita da obra foi um marco em sua carreira, pois foi quando ela percebeu que a escrita havia se tornado a sua profissão, deixando de ser uma atividade apenas prazerosa e amadora, para se tornar a maneira como ela ganhava dinheiro. Assim, ela se sentia pressionada para publicar um outro livro e, ao mesmo tempo, sem inspiração para criar. O resultado é uma adaptação de uma outra história que ela havia arquivado.

Contudo, preciso dizer que mesmo com esses bastidores conturbados, O Mistério do Trem Azul é uma leitura divertida e envolvente. Aqui somos apresentados à Ruth Kattering, uma mulher faz parte da alta sociedade britânica e é bastante infeliz em seu casamento com Derek. A união dos dois ocorreu apenas por conveniência e interesses e, por isso, ela está determinada a se divorciar. Após embarcar no famoso Trem Azul, rumo à Riviera Francesa, ela é assassinada durante a noite e seu colar de diamantes - uma joia conhecida como Coração de Fogo, que pertenceu a reis, imperadores e czares - desaparece. Ninguém observou nada de estranho, o corpo só foi descoberto na manhã seguinte e o criminoso, aparentemente, não deixou pistas. Porém, para a sorte da polícia francesa, Hercule Poirot estava à bordo do trem e resolve abandonar a sua aposentadoria para auxiliar nas investigações.

Também conhecemos Katherine Grey, uma jovem dama de companhia bastante observadora que herdou uma grande fortuna. Por estar no Trem Azul e ter sido a última pessoa a conversar com a vítima, ela logo se torna uma "ajudante" do Poirot na investigação. Por meio das conversas entre eles, observamos o método do detetive belga sendo aplicado e, ao mesmo tempo, também conhecemos mais sobre Katherine, que me lembrou um pouco a protagonista de "O homem do terno marrom". Com a personagem, acompanhamos uma história paralela de romance. É algo bem sutil, mas que em alguns momentos fica mais interessante que o caso de assassinato, que se torna enrolado e confuso em determinados trechos, ainda que traga uma solução satisfatória.

De forma geral, esperava mais de O Mistério do Trem Azul. Mas, como disse, é uma leitura divertida e que prende a atenção do leitor do início ao fim. Como sempre acontece com um livro de Agatha Christie, existem pistas para serem seguidas e é sempre legal quando conseguimos descobrir alguma informação antes do detetive em questão.




11 de março de 2020

O Assassinato de Roger Ackroyd (Agatha Christie) | Hercule Poirot, livro #4

Desde que decidi ler as obras de Agatha Christie de forma mais ou menos cronológica, meu interesse por O assassinato de Roger Ackroyd só aumentava. O livro está sempre nas listas de melhores obras da autora, é o favorito de muitos fãs e é o único trabalho dela na lista dos 1001 livros para ler antes de morrer. A expectativa estava alta e fico feliz ao perceber que foi atingida. Até agora não acredito que consegui escapar de spoilers e pude ter uma experiência de leitura completa, sem interferências e meio que sem saber para onde tudo estava caminhando.


Aqui somos apresentados à King's Abbot, uma vila pacata na qual os moradores passam a maior parte do tempo fofocando e nada de muito interessante acontece... exceto assassinatos. Logo no início ficamos sabendo da morte de Mrs. Ferrars, que de acordo com os rumores da cidade, cometeu suicídio. Sua morte ocorre um ano após a de seu marido, que teria morrido após ingerir soníferos, mas há quem acredite não se tratar de um acidente. Para completar a sequência de mortes estranhas, Roger Ackroyd, um dos homens mais ricos da região, é encontrado em sua mansão após ser esfaqueado com uma adaga de sua própria coleção. Caroline Sheppard é uma das mulheres mais fofoqueiras e mais bem informadas da cidade e acredita que as mortes estejam relacionadas. Desconfiada, ela resolve pedir a ajuda de seu vizinho, um detetive belga aposentado: Hercule Poirot. 

O livro foi publicado em 1926 e traz alguns dos elementos mais característicos nas obras da autora, ao mesmo tempo em que subverte alguns aspectos para surpreender o leitor. Poirot utiliza seu método de investigação, sua capacidade de observação e as suas células cinzentas para chegar à verdade. Toda a verdade, como ele gosta de dizer. É uma história com nuances e nada é como parece; todo mundo esconde algo e, por isso, a atmosfera de desconfiança é constante. Se você é como eu e também gosta de desempenhar a função de detetive, O assassinato de Roger Ackroyd é um prato cheio. Aqui temos segredos para serem desvendados, pistas confusas, reviravoltas e personagens com motivações diversas para serem considerados assassinos em potencial. O que mais gostei nesse livro é que tudo é bem redondinho e nenhuma ponta fica solta. O final é surpreendente, tanto na revelação do assassino, quanto no que se segue após esse momento - provavelmente, o aspecto que mais me impactou no livro.

Eu consegui descobrir quem cometeu o crime antes do desfecho, mas isso não quer dizer muita coisa, pois essa é uma história bem engenhosa, do tipo que dá um nó no cérebro e explode a sua cabeça no momento da revelação. São vários pontos que precisam ser explicados, então mesmo adivinhando quem cometeu o crime (e, realmente, dá para ficar na dúvida entre os suspeitos), ainda é necessário descobrir o motivo e encontrar soluções para outros mistérios que surgem na história. São muitos os detalhes e, como costuma acontecer nos livros de Agatha Christie, neles se escondem as respostas. E isso é o máximo que posso dizer sem revelar muita coisa, pois esse é o tipo de livro que é melhor ler sem saber muito e se deixar surpreender. 

Ainda não sei se O assassinato de Roger Ackroyd será o meu livro preferido da autora, mas é o que mais gostei até o momento desde que resolvi (re) ler seus livros. Entendo o porquê de muitas pessoas o considerarem o melhor trabalho da autora e também compreendo a sua importância para o romance policial, pois a autora inovou em alguns aspectos e trouxe um impacto significativo para o gênero. Peço que me desculpem por ser ~misteriosa~ e não revelar mais ou dar muitas explicações, mas faço isso pelo bem de quem tem interesse em ler o livro, ok? Leitura mais que recomendada!





 Esta leitura também faz parte do desafio 1001 Livros Para Ler Antes de Morrer.

3 de março de 2020

Dentes de Dragão (Michael Chrichton)


Publicado em 2017, Dentes de Dragão é uma obra póstuma de Michael Crichton, falecido em 2008. Já fazia um tempo que queria ler algo do autor, mas não sei se escolhi a obra certa para começar. Se eu tivesse que classificar o livro, diria que é uma mistura de aventura, ficção histórica e western que traz também alguns elementos de romance de formação.

Aqui temos uma história ambientada no Velho Oeste e que inicia no ano de 1876. Esse contexto também ficou marcado pela Guerra dos Ossos, uma disputa entre os paleontólogos Othniel Charles Marsh e Edward Drinker Cope. Logo no início, somos apresentados ao protagonista, William Johnson. Ele é um jovem universitário de família abastada sem muito foco na vida e que, após fazer uma aposta com outro estudante de Yale, acaba se juntando à uma expedição e viajando para um local onde irão ocorrer escavações em busca de ossos de dinossauro. O que acompanhamos é a jornada de Johnson, os contratempos que surgem, as descobertas que fará, os amigos e inimigos que encontrará, etc. Um aspecto que gostei é que, a princípio, nem tudo é o que parece e, por isso, acontecem algumas reviravoltas.

A narrativa do autor é, provavelmente, o aspecto que mais me interessou. É bastante envolvente, de um jeito bem cinematográfico e dinâmico (Michael Crichton também foi roteirista!). A maneira como ele descreve os cenários percorridos pelos personagem nos transporta para lá. A ambientação é outro ponto muito positivo, não só porque o autor descreve os lugares da forma como eles eram naquela época (visitar o Google à procura de fotografias antigas comprova isso), mas também porque em alguns trechos ele insere informações históricas com intuito de fazer o leitor se situar melhor. Ele também se utiliza de certa liberdade ao inserir algumas pessoas que realmente existiram como personagens; é o caso, por exemplo, dos paleontólogos Marsh e Cope, do pistoleiro Wyatt Earp e do escritor Robert Louis Stevenson. 

A tensão também é um fator bastante presente na história. O tempo todo prevalece uma sensação de perigo iminente, seja porque existe a possibilidade de enfrentamento entre expedições, ou de adentrar territórios indígenas, ou a ocorrência de ataques de animais. O cenário árido e inóspito contribui também para a criação de uma atmosfera com estilo de thriller. Ainda sobre a narrativa, apesar de envolvente, em alguns trechos ela pode ficar um pouco arrastada; é o caso de algumas partes em que os personagens apenas percorrem longas distâncias e torcem para que nada de ruim aconteça. Não ocorre o tempo todo, mas achei bom avisar.

Como disse, gostei da leitura, mas ela não foi tão marcante como imaginei. Pensei que seria um livro com foco maior nas escavações e no que delas resultaria, mas a descoberta feita não é tão impactante na história e acaba funcionando mais como um recurso para movimentar a narrativa e fazer tudo acontecer. O livro é menos sobre fósseis e dinossauros e mais sobre o Velho Oeste - com suas incertezas e seus perigos - e a trajetória do protagonista. Ao longo dos capítulos acompanhamos um processo de crescimento pessoal e amadurecimento vivido por Johnson e isso irá transformá-lo em um adulto. A partir dessa perspectiva, de ser uma história também sobre transição, acabei por enxergar o livro de uma forma diferente e, por isso, acabei por gostar da experiência. Não sei se Dentes de Dragão será uma leitura memorável, mas recomendo a leitura para quem se interessa por esse tipo de história.

"O mais natural seria achar que as vítimas da injustiça pensariam duas vezes antes de repetir a mesma injustiça com alguém; mas elas o fazem sem nenhum pudor. De vítimas passam a algozes, levadas por uma certeza moral que chega a provocar arrepios. Essa é a natureza do fanatismo: atrair e incitar extremismos. E é por isso que, qualquer que seja a linha do fanatismo, todos os fanáticos são iguais". (p. 73)